Os Getulianos

No início do curso, os estudantes eram conhecidos como GETULIANO!

  
     Os Getulianos são caras que acordam antes das galinhas, comem tanto que necessitam de repouso após o almoço, fazem da quarta-feira de tarde o seu dia santificado, conjugam o verbo “patear” no presente e no futuro...

  
  Não tem estudante que goste de levantar cedo! Parece até que a idéia de estudar está diretamente vinculada à idéia de dormir... O getuliano - como eram conhecidos os estudantes do Colégio Presidente Getúlio Vargas (atualmente Centro de Ensino Médio SETREM) não foge à regra. É dorminhoco e protestante. Dorminhoco porque gosta de dormir além da hora; protestante porque o plantão não permite isso...

    Geraldo Antonio Schneider do 2° ano do Curso Técnico em Agropecuária, morador de São Martinho e por isso mesmo, “Marciano” (Martinho é entendido como diminutivo de Marte), entregou o ouro e diante da promessa de que não iria “patear” pela entrega que estava fazendo, falou do dia do getuliano.

   Geraldo contou que o dia já começa às 06h30min, quando ainda nem as galinhas se levantaram. Toca o sino e todos fazem que não ouviram. Não ouvem, mas sentem quando o plantão passa nos quartos, liga as luzes, abre as janelas, dá uns gritos e se tudo isso ainda não adianta, puxa as cobertas.

   Às 07h, sempre sob o comando dos toques do sino (tai “por quem os sinos dobram!”) é servido o café. Alguém pode preferir dormir em vez de tomar café. Prefere, mas não leva. O café, como todas as refeições, é obrigatório. Tem que comparecer, nem que seja apenas para a oração e para a devolução da louça dos talheres à copa. E quem chegar atrasado tem que pedir autorização para diretor do Internato, “tio Perna”, aliás, prof. Martin Heinrich Hasenack, muito benquisto dos internos (talvez por permitir o café dos atrasados... quem sabe?). O plantão do dia também pode autorizar o café dos atrasados, e ao contrario das demais refeições, no café da manha não precisam aguardar a oração final para poderem sair (há quem diga que se isso fosse exigido, muitos adormeceriam de novo na mesa, mas deve ser intriga...). Às 07h45min começam as aulas até as 11h55min, com um recreio de 15 minutos, às 10hs15min.

    Às 12h10min era o almoço, e nesta hora não é preciso insistir. Mesmo que os getulianos sejam exatamente iguais a qualquer outro interno, isto é, também se queixam da comida, mas todos comem e... repetem! comem tanto que necessitam de um repouso após o almoço, que vai até às 13h30min.


     Conta o Geraldo que todos os dias têm uma turma que não tem aulas pela tarde. É à tarde em que os estudantes que tem “bolsa-trabalho” precisam trabalhar 250 horas por semestre, para ajudar a custear seus estudos. Os demais precisam estudar, nas salas de estudos, até as 15h. Depois das 15, estes ganham liberdade, podendo fazer qualquer coisa, com exceção de duas: ir para a cidade e atrapalhar os outros.

O DIA SANTIFICADO DO GETULIANO!
  
    Mais do o que próprio domingo, o dia mais esperado pelos getulianos era as quartas-feiras pela tarde. E há uma porção de motivos para esta esperança tão grande... Contam em Três de Maio que quando uma moça está a fim de um getuliano, nas tardes de quarta-feira, esta moça pode ser encontrada nas ruas e praças da cidade... Contam também que, quando o pessoal da Faculdade de Administração lotava um ônibus para ir às olimpíadas, uma gatinha não se conteve:
- Ah, tomara que eu consiga sentar perto de um getuliano!

    Claro que tem também outros motivos para justificar esta ansiedade pelas tardes de quartas-feiras. Tem aqueles que vão fazer compras, tem os que vão visitar a namorada já assumida, têm os que vão paquerar, bater papo, tomar umas e outras... Como têm também aqueles cujos pais moram perto de Três de Maio, como é o caso do Geraldo, que muita vezes, vai para casa nestas tardes.

    As mas línguas de Três de Maio contam que o Colégio das freiras mudou a folga de suas internas de quartas para terças-feiras. Somente assim, contam, as irmãs conseguiram conter o “ímpeto amoroso” dos getulianos.

   Quando alguém está “pateando” (significa no linguajar getuliano, bancar o pato, trabalhar, estar cumprindo a pena por alguma falha cometida). O que mais lamenta não é o fato de estar pateando, brabo é não sair nas tardes de quartas...

   Um dia destes dois internos se mandaram. Pegaram um atalho, meio encoberto pelo trigal, e foram sair lá na frente, já na boca da rua. Quando estão pintando na rua, pinta também o corcel branco da professora Élida, num repente os dois saltaram para o meio do trigal, atirando-se ao chão como se a professora estivesse apontando uma metralhadora. Assim que o carro parou, vendo que tinham sido flagrados, os dois levantaram:
- nós temos permissões para sair, ‘sora...
- Então porque estão se atirando no chão desse jeito?
Bah!

 A folga desta tarde termina no horário da janta. Aí todos precisam estar de volta. Poderão sair depois da mesma, até as 22h30min.

Qualquer irregularidade... chegar atrasado, bêbado, não chegar, não comparecer à janta, etc... é passível de punição. Por isso o verbo patear passou a ser um dos verbos mais conjugados pelos getulianos... Patear, perder o fim de semana, patear de novo, tudo é suportável. Insuportável é perder a próxima quarta-feira!

As 18h30min é a janta. Folga até as 19h15min, quando começa o estudo que vai até as 20h30min que são obrigatórios. As 21h dão o sinal de silêncio, como até, aquela hora o silêncio ainda é um ilustre ausente, quem dá o sinal é o sino, para que todos ouçam. Apagam-se as luzes e, aos poucos, o silêncio ocupa o seu lugar, o que só acontece definitivamente, quando o plantão passa e usa os seus argumentos...

Bagunça dá é quando falta luz! Nestas horas o plantão nem aparece porque sabe ser em vão sua presença. Rolam latas, a gritaria é geral e nesta hora de escura liberdade o getuliano é feliz... E quando pode também “cuca” uma brincadeira com os professores. Uma latinha de água estrategicamente colocada e estas coisas que fazem a alegria de quem é interno.

Condição imposta pelo Geraldo, além da garantia de que não irá patear por causa disso, foi à publicação dos apelidos dos professores. No pátio as cobranças foram intensas.

Os professores naquela época tinham que suportar o suplício da publicação de seus apelidos...
* Prof. Martin Heinrich Hasenack  – Tio Perna
* Prof. Ivo Mai – Mairimbondo
* Prof. Paulo Rnüppe – Profeta (pelas suas aulas de religião, pela barba e pelos palpites)
* Prof. Leandro Lied – Bode (pela sua barba, visível à lupa)
* Prof. Cesar Ferreira da Fontoura – Narizinho (pela facilidade em fumar nos dias de chuva)
* Prof. Dalziro João Valdameri – Perito e Popó
* Prof. Valdir Antonio Benedetti – Gata (diz que quando era goleiro, pegava tudo. Hoje, já nem tanto...)
* Profa. Élida Volbrecht – Vetor (deveria ser vedor, por causa do lance contado há pouco)
* Prof. Eno Schrvartz – Minicoca (pela sua estrutura. Alguns apostam que alcança 1,50 metros...)
* Prof. Jorge Lothar von Mühlen – “Richtig!” (O que ele fala isso nas aulas de alemão não tá no gibi. Afinal o que significa isso, professor?)
* Prof. Vicente Luiz Gentil – Pedigree (conta-se que, com ele, animais somente com pedigree...)
O mais estranho de tudo é que o diretor e prof. Erni Arthur Vollbrecht, não tinha apelido. Suspeito isso!...
     
     Um ponto de encontro dos getulianos que fazia muito sucesso naquela época era o “BORELA”, aonde sempre os getulianos iam nas quartas-feiras as tardes.

Fonte: Jornal SETREM. Edição de novembro de 1984 – n° 1.

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